maio 13, 2007

waste on you

Era mesmo a única coisa que me apetecia quando desci e assentei no pulsar daquelas batidas. Era exactamente deixar-me esvair como o mar de sangue que periodiamente me escorre pelo corpo, num dilacerante descontrole da minha embriaguez mental. Era chegar aqui, e aqui não estar ninguém. Eu não queria ninguém. Eu queria apenas entrar e que este espaço fosse só meu e estivesse completamente vazio de almas, corpo, e material. Que fosse todo desapoderado de respiração alheia e de pulsações exteriores. Queria-o só para mim sem qualquer parede sequer de forma a que eu me evadisse totalmente sem as barreiras usuais da comunicação. Essas que me limitam e me transportam para aquela dimensão da incompreensão. Mas era algo mais. Aqui havia algo que realmente ultrapassava tudo.
Havia o cansaço, havia o fatalmente. Quando tudo é fatal, em qualquer momento da nossa vida, sentimos assim uma eclosão quase laboratorial em crescimento contínuo, numa perspectiva egoísta da nossa saciedade intelectual. Olhamos em redor todavia não identificamos nada que nos transmita aquilo que queremos ver porque, de facto, não queremos ver nada. Porque o nada, o vácuo que afinal nem existe e só nos estilhaça, clama pela nossa insanidade aleatória. Qual espaço, qual divisória, aqui nada nos separa. É estranho. Acaba por ser guturalmente monocórdico. Uma falta de palavras. Eu não sei comunicar pela falácia da linguagem, nem pelos intermédios que brotam da minha imaginação fértil(essa esconde-se atrás de um arbusto gigante e não me deixa assomar nem por um pouco), eu apenas naquele instante mantenho-me na minha posição que não avança nem recua.
E depois? O que mudou? Mudou muito. De facto mudou imenso. Nem eu sei creio eu. Mas sim. O que eu queria mesmo era que este desgaste, este waste on you, penetrasse na minha pele e erradicasse por todos os poros, por todas as vias e me transplantasse para um terreno, o qual eu penduraria a minha cabeça por uma moldura de quadro castanha, e pendesse o meu corpo por igual numa linha simétrica onde me conseguisse ver pelo outro lado. Esse outro lado. Acaba por ser uma questão insistentemente metafórica. Eu acabo por me permitir ascender a esse porto inseguro, esse posto de passagem obrigatória, aí está a palavra, obrigatória. Não preciso nem me ressinto com as atitudes, elas passam-me ao lado e assusta-me o facto, não de passar ao lado, mas de tudo aquilo convergir para um ponto, que por mais que procure não encontro, dentro de mim. E aí dentro de mim, situa-se a encruzilhada que me consome o espirito e me engradece a existência. Dentro de mim saltam as necessidades primárias. O desejo mais visceral de me relacionar sexualmente com a minha intempérie freudiana, com aquele snobismo material que teme a presença de mim neste ponto onde nada se intersecta e tudo se sobrepõe.
Sabe, sabe fundamentalmente bem a àgua e a luz ténue que ilumina essa circuncisão que efectuei propositadamente no meu corpo, na minha perna, no meu tornozelo, no meu peito. Agride puerilmente esse desdobrar consecutivo de imagens invertidas onde meras ideias se ligam a meros esforços alheios, onde afinal custa interiorizar mas não custa perceber, e nesse ponto, esse que desconheço assenta essa procura, essa força meio mal direccionada que decididamente desprezo. O que resulta dessa decisão? Pode resultar tudo como nada. Posso resultar eu. Eu resulto sempre. Que parte de mim? Essa que desceu, andou e sentiu tudo em cima de si? Não haveria suporte. Poderia ser comprado, angariado, leiloado, estaria simplesmente à venda? Creio que não.
Eu desci não para isso, não para responder sequer, eu saí para me esvair, esvair num patamar qualquer, num chão qualquer, num branco, num azul amendoado, eu apenas fui anotando os restícios dos dias, ignorando as sensações, todas elas antigas e carregadas de pó. Porque não me faz falta.
Eu cumulativamente nem cheguei a descer um degrau que fosse, na medida que aquilo que se me apresenta diante dos olhos não passa de uma mera percepção, uma súbita pertinência, uma indissociável característica comportamental. Mas quanto a isso....


listening@ Waste/ Archive.