março 04, 2010

erase . rewind .


Porque tudo é assim mas mantemos a dificuldade em acreditá-lo. Aceitá-lo. Encará-lo.


‘Olhou-me nos olhos como quem olha para uma certeza florescida em terra sã, bravia, indomável. Percorreu o olhar por esse castelo de arbustos encadeados, robustos, impenetráveis. Parou nos meus lábios, como sempre o faz. Continuou. Atirou uma pedra de granizo frágil contra esse escudo sereno. Eu acomodei-me à forma dessa interrogação’.

What do you want?

E naquela passadeira rolante deixei o meu coração saltar, eclodir, serpentear, permiti que fosse o arguido de um julgamento sem juiz. ‘Tudo bem, está tudo bem’. Saí, parei. Adormeci retoricamente em mim, constatei essa tensão crescer exponencialmente por entre os meus soldados guarnecidos a fel, absorvi essa base e levantada a um x quadrado. Estagnei. Não passa, não passa. Não entra. Não entra. Não engole, não flui. Estagnei. Nos nervos da minha subconsciência, no vómito do dia seguinte. E encontrei o meu coração vomitado em mil estilhaços no vão de um recipiente qualquer. Tumultuado. Não parado. Batendo cada vez mais compassadamente, fora de mim. Desta feita, longe de mim, paralelamente ao meu corpo.

Nada .

Uma vez ela, uma personagem de uma ficção televisiva qualquer, disse que não era o coração que doía porque o coração não dói. Era mesmo o seu estomâgo, esse âmago que trabalha 24 horas por dia, centrado bem debaixo do seu peito. Era esse que mirrava, desaparecia, batia, pulsava. Era aí que se sentia a efervescência do desencanto, da desilusão, da dor desmembrada.
Sentido-lhe o desespero na emoção libertada, fui obrigada a concordar. Na competência da sua representação, senti-me reconhecida. Como quem atravessa uma rua e é cordialmente cumprimentada quando alcança o lado requerido, ‘Então tudo bem? Há quanto tempo!’. Está tudo, tudo bem. Aqui do lado do meu coração.


i'm hanging on a thread that's bound to drop .

E como as marés que abrandam e descem, concedendo vazão a uma nova preia-mar, senti as ondas resvalarem do meu corpo, levemente me abandonando, como que me afagando lentamente, rebentando vagarosamente, espalhando a sua espuma branca pelo meu peito, barriga e coxas. Senti o equilíbrio bater à porta da minha tensão e aguardar tranquilamente a abertura dessa muralha. Senti-o penetrar e dissecá-la, docemente, quase sem se notar. De um momento para o outro. Tal e qual a minha bipolaridade me permite. Contudo senti acima de tudo, que podemos ser totalmente direccionados, consumidos e digeridos, por essa máquina egoísta que é a nossa orgânica existencial. Que todos os órgãos que constituem o nosso corpo se unem, como numa orgia musical, e se sistematizam num musical periódico, melódico, harmonioso. Onde a nossa racionalidade é apenas conduzida a ouvi-lo, inocentemente, incoerentemente, impotentemente. Como mera espectadora de si própria. Como mera observação de um reflexo no espelho.E analisando esse reflexo, ela identificou as notas soltas de uma composição maldita, que caminhava a passos largos para o túnel da auto-destruição, e dilacerou-as, atingindo-as com tiros certeiros em cada vértebra responsável pelo caos instalado. Residente nela, alimentando-se como uma ténia sarcástica, rindo-se do pobre corpo que habitou à má fé. Ela a razão, foi mais alta, foi mais forte no seu preto no branco.

but i'll always choose the black in front of white .

E aí é como se te tivesse escrito, como se nos tivesse escrito, numa folha de papel em branco, e fosse diariamente e como mais força, apagando com uma borracha rectangular de cor branca, essas linhas dispersas, difusas na minha turbulenta inconstância. Na minha ambígua insegurança.


Até ao dia que apagarei totalmente, de uma vez só.

E assim. Volto atrás. A ti, meu amor. A mim.


and when it hurts the most i’ll push a little more .

i’m back where i started at .


you know.

i’m a little lost .


5 anos feitos no dia 15 de Fevereiro. Espero que este post esteja à altura de tamanha data. Não me foi possível escrever no dia, mas não consigo deixar passar em branco. Cinco anos de construção de um canto que é só meu. E cada vez mais meu.