fevereiro 10, 2010

Lars...Lars...Lars....

Lars Von Trier nascido em København em 30 de abril de 1956 é um cineasta dinamarquês, conhecido por ter fundado o movimento Dogma 95 com Thomas Vinterberg, um manifesto com 10 regras de realização.


Depois de filmes como Breaking the Waves, Idioterne, Dancer in the Dark, Dogville e Manderlay, Trier escreveu/realizou Antichrist. Nas salas de cinema actualmente, encontra-se esta sua última obra, estranhamente aos meus olhos estreada nos cinemas. Visionei-o há sensivelmente dois meses e não esperava que tivesse honras de aparecer em cartaz. É tão complicado hoje em dia acreditar sequer que filmes de nomes como Trier façam dinheiro no nosso país que fiquei surpresa, contudo saúdo o acontecimento e escrevo a propósito desta estreia. Há muito que poderia ter falado de Lars mas agora materializa-se a vontade.É complicado dissertar acerca dele ignorando as suas obras e muito mais dificil será apreender Antichrist sem saber o que levou Lars a fazê-lo e sem conhecer a sua caminhada anterior.
Antes de mais Antichrist é redenção. Exorcisão do seu autor, libertação de demónios, uma obra extremamente auto-centrada e até autobiográfica, egoísta. No limiar da sua necessidade, ele próprio revelou que já foi uma sorte ter conseguido realizar este filme. Saído de uma depressão profunda, Lars lança-se no objectivo de expulsar o seu veneno, dar cor, vida e forma ao seu tormento. E daqui resultou Antichrist. Um filme de e para Lars Von Trier.

(e como eu gosto de dizer...) um prologue (em francês)...um dos mais belos e perfeitos prólogos feitos na história do cinema, Händel, Lascia Ch’io Pianga, um homem, uma mulher, uma criança, neve, um boneco de peluche e sexo. Seguem-se quatro capítulos, quatro etapas: Grief. Pain (Chaos reigns). Despair (gynocide). The Three Beggars. E um epílogo. Três animais. Muito do imaginário e da força do feminino face ao masculino encontra reflexo na obra de David Lynch. Então aqui denota-se um paralelismo. Há muito de lynchiano na caracterização dos animais de Trier. Há muito no exorcismo, na fantasia, no terror de Trier que encontra aconchego em Lynch.Uma interpretação fantástica de Charlotte Gainsbourg. E novamente, meu Lars...Lars...Lars. é um manipulador. Constante. Manipulou-me até ao choro convulsivo em Dancer in the Dark, dilacerou inteligência no brilhante final de Dogville, deixou-me um amargo na existência em Breaking the Waves. Onde Antichrist se relaciona com eles? Não se intercepta. Não se cruza sequer. É um trabalho aparte, indomável, forte, insidioso. Não são as meras transmutações mentais em ejaculações de sangue ou cortes genitais a sangue (e vista) frio, que fazem de Antichrist um filme censurável ou complicado de digerir. É o quão tormentoso foi o processo que Trier atravessou para vomitar os seus demónios e transfigurá-los em tela, sem pincel. O quão sacrificou ele para colocar dois actores atrás do seu próprio sangue estagnado.Aqui ele não manipula, aqui é ele o manipulado. Por si e para si. Mas onde se encaixa este Antichrist que agora estreia em Portugal e foi vaiado e incompreendido em Cannes? Encaixa-se na singular concepção de filme quase. O quase obra de arte. Não se conecta com as suas anteriores obras porque muito distinto é mas muito aquém fica do envolvimento visceral que elas transmitem. Antichrist estreia numa altura em que a palavra gratuito sai da boca dos críticos como se intensifica a necessidade de realizadores como James Cameron fazerem milhões. Dinheiro, poder, transcendentalidade. E estas onde se cortam?

Não acredito que Lars tenha chegado a um ponto estanque. Continuo a esperar que ele me incendeie a existência mas não a custa do seu próprio sofrimento. Pain and sorrow. Sem observar a sua garmonbozia prostrada aos meus pés. Não. Sim eu gosto muito de Lars Von Trier, ele me revolve, consegue mexer comigo...mesmo que eu não queira ou não consiga racionalizar conscientemente. Existe algo na misogenia e na sua pretensão artística que consegue quase o impossível. Porque me sintonizo no meu desepero. E infelizmente aqui, ele não o conseguiu. (também em nenhuma obra como Dancer in the Dark me senti tão humilhada emocionalmente). Sim. É essa mesma pancada psicológica que almejo. E Antichrist sem deixar de ser um notável filme, reduz-se ao grief que Trier fez de si. E ele sabe-o. Resta-me apenas a pena de não aceitarem que um carismático realizador faça porque o faça. E o obriguem a proferir o tão ingrato ‘i’m the best film director in the world’, que fala per si.Em Cannes este objecto cinematográfico foi alvo de alguma celeuma. Aqui deixo o momento.

http://www.festival-cannes.com/en/mediaPlayer/9902.html

e mais algumas páginas interesssantes:

http://cinecartaz.publico.pt/noticias.asp?id=249953

http://aeiou.expresso.pt/quem-e-lars-von-trier-cujo-filme-anticristo-estreia-hoje=f559277