abril 08, 2007

Inland Empire

I don’t care about that...it is something more...David Lynch nasceu a 20 de Janeiro de 1946 em Montana EUA, tendo inicialmente o sonho de ser pintor. Para isso partiu rumo à Europa de forma a encontrar inspiração para o seu trabalho. Porém viu-se obrigado a fazer trabalhos que não o agradavam e entrou para a Academia de Belas-Artes. Completamente absorvido pelas artes plásticas, realizou as suas primeiras curtas metragens: Six Men Getting Sick (1966), The Alphabet (1968), The Grandmother (1970) e The Amputee (1974). Em 1971 iniciou a sua primeira longa-metragem, Eraserhead que apenas terminou em 1977. Aqui já se observava o tão famoso mundo bizarro de Lynch e arte em stop-motion. O seu primeiro grande filme surgiu em 1980, The Elefant Man, que recebeu 8 nomeações para óscar. Seguidamente o seu trabalho envolveu nomes como: Duna em 1984, Blue Velvet em 1986, Wild at Heart em 1990, Twin Peaks: Fire walk with me em 1992, Lost Highway em 1997, The Straight Story em 1999, Mulholland Drive em 2001, e a consagrada série Twin Peaks em 1990..(quem matou Laura Palmer?..).

E agora Inland Empire. 2007.

O surrealismo existe em qualquer arte. Como na música temos Beethoven, na pintura Van Gogh, na literatura Bataille, na sétima arte, esta arte tão mal amada por vezes, encontramos David Lynch. Atípico, brilhante, metaforicamente sublime, é Inland Empire. Este estado usado como eufemismo de um mundo dentro de mundos e por aí adiante. Isso é Inland Empire. Um mistério que se desdobra no interior de vários mundos que se cruzam na mesma pessoa. E nesse desdobrar Lynch mistura fantasia, sonhos e ficção. Interliga a realidade com o ficticio. E poder-se-ia dizer que o faz repetidamente em todas as suas obras, ou nas mais bizarras, mas não, aqui assiste-se a um ultrapassar de todas as barreiras. Lynch não se excedeu, Lynch superou-se. Conseguiu transformar Mulholland Drive numa brincadeira de crianças. Não posso sobrepôr a importância de cada um destes filmes, embora a complexidade do novo filme de Lynch ultrapasse os limites da confusão mental do primeiro, e todavia também, que comparado a Mulholland apresente uma certa falta de emoção e envolvimento do espectador . O que se estabelece é uma ligação metafisica a nível fundamentalmente cerebral.Aparte. Encaremos as coisas como elas são, ou melhor, interpretemos o filme como ele é. E aí está, ele apenas é. Ele existe e apresenta-nos diante da vista independentemente se vamos ou não compreende-lo, se vamos reflectir sobre ele, se simplesmente o repudiamos ou amamos. Ele não se importa, para ele é-lhe irrelevante. O filme apenas é e desliga-se totalmente de qualquer tomada de consciência. E este posicionamento é invejável. Até é mais, é majestoso. Lynch simultaneamente que reuniu todo o seu universo sórdido, ofereceu-nos de bandeja a possibilidade de contemplação pura e somente sem questionar. Ora isso não retira a atitude de pegar em pequenos pormenores e juntar numa linha de raciocínio, mas Lynch é mais que isso, ele descarrega a espiral dos horrores familiares à nossa memória mas não deixa de estabelecer uma narrativa. Com lógica, pois claro. O que é feito baseia-se num arrancar do espectador, já mais que habituado a ter a ‘papinha’ feita, a escorregar pelo abismo da insanidade, tentando a todo o custo ligar as peças soltas, fragmentadas e indissociáveis umas das outras. E que não se esqueça isso, todas elas são indissociáveis. Mas mais, mais, pratica-se um “vale-tudo” elevado à exponencial libérrima condição de Lynch: manter consigo e somente consigo a chave que abre os fragmentos alucinogéneos que intercruzam a nossa mente. Súbito devaneio, instantâneo transe epiléptico, transfiguração orgânica de imagens invertidas em planos malditos, eis a combinação explosiva que eclode em uma bruta génese cinematográfica.

Uma viagem apocalítica, sensorial, em que nos é fornecida a exaltação da nossa própria loucura psicológica, que nos revira pelas fronteiras da cerebralidade por um processo sem fim. Talvez eu tenha adoptado uma postura essencialmente vulnerável à percepção de um objecto que vive para si, e daí tenha saído esgotada como se tivesse passado um mês inteiro a estudar sem parar. Ele extenuou-me. Num cansaço grotescamente viciante, em que o corredor do vanguardismo contemporâneo lhe deve o primeiro lugar no topo da excentricidade artística. A arte. Às vezes tem destas coisas. Deixa-nos sem folêgo.Lamento encarecidamente, que ainda existam seres vivos que se arrastam para as salas de cinema apenas porque sim e transformam a própria num antro de estupidez atroz. Não é compreensível que usem o riso para disfarçar a sua mediocridade intelectual nem muito menos que saiam a meio e digam:’Que Seca!’. De facto é uma seca. Lynch é uma grande seca. Uma seca tremenda que abate os mais infames desprovidos de inteligência e cultura, num poço de basicidade crua e dura.




De facto! Lynch é um embaixador do surrealismo no cinema e por consequência é complicado aconselhar vivamente quem seja de ver esta magnifica obra ou qualquer outra. Porém não recuo em eleger como soberbo este ‘objecto’ de pura arte.